O questionário: a última habilidade de António Costa?



Nos últimos nove meses de governação assistimos a treze demissões, a uma sucessão de casos, que não são casinhos, a uma crise de que não há memória, e que levou o Governo a aprovar um questionário para ser respondido pelos seus futuros membros previamente à proposta ao Presidente da República da sua nomeação. A resposta a 36 questões surge como a promessa de solução do Governo para um problema que ele próprio criou. 

Como panaceia para todos os males sucedidos o dito mecanismo de escrutínio esquece ou quer convenientemente fazer esquecer o que verdadeiramente está na génese desta crise, sendo mais uma tentativa de iludir o problema, mais uma habilidade política do nosso Primeiro-Ministro. 

A partir de agora e já que bom senso e responsabilidade não espera o Governo daqueles que convida, com o prévio inquérito não existirão mais casos que afetem o inocente Governo trapaceado nas nomeações que fez!

Desde logo é evidente que nenhum questionário se poderá substituir à autoanálise dos convidados sobre as suas condições para exercer funções políticas. Depois, basta estar atento ao sucedido para perceber que o problema não está na falta de informação dos visados, mas na indiferença perante a informação conhecida, e isto é que é verdadeiramente preocupante. 

Os casos que se sucederam eram do domínio público, foram relatados e comentados e não obstante de nada adiantou pois quem tinha a responsabilidade maior ignorou-os e mesmo os negou. Mas ninguém no Governo se pergunta se aquela pessoa que quer convidar tem condições para exercer determinado cargo, se tem competência para tal, se tem conhecimento e experiência para tal? As perguntas que fazem parte do questionário não eram já feitas aos candidatos a governantes? É que são perguntas básicas e de elementar bom senso. 

Este questionário pouco ou nada é, tudo mistura; incompatibilidades, ligações pessoais, casos fiscais e judiciais, e serve apenas para desviar a atenção dos casos graves que aconteceram e alijar responsabilidades, ignorando o essencial.  

Repito, na base desta crise está a ausência de bom senso e de consciência, em primeiro lugar dos visados e depois de quem os indigitou. 

Assim se percebe que a solução apresentada na prática só pretende desresponsabilizar o Governo e o Primeiro-Ministro de uma sua obrigação, saber quem nomeia para funções governativas, da escolha dos membros do seu Governo. 

Tudo amalgamando para nada mudar ou esclarecer, trata-se de modo igual questões que são diferentes, toma-se o todo pela parte e, assim, irresponsavelmente alimentam-se perigosos populismos, que ferem a democracia e desgastam as instituições democráticas e estão na base do perigoso “é tudo farinha do mesmo saco”. 

Discute-se agora se o questionário se aplica ou não aos governantes já em funções, com o Presidente da República a afirmar que em nome do bom senso que tem de se aplicar a todos. E se assim for, como parece que faz sentido ser, quantos mais casos e demissões podem acontecer?

O populismo faz caminho sempre que as instituições não funcionam, e caem na descredibilização e esta sucessão de casos tem contribuído para tal como nunca se assistiu na nossa Democracia, impedindo que o Governo cumpra a sua obrigação, que é a de governar, gerir a coisa pública, respeitar a responsabilidade que tem em nome do Estado. 

A máscara do Primeiro-Ministro caiu e já nem a sua habilidade para a manipulação da realidade é suficiente para que os portugueses continuem a acreditar na sua narrativa, sendo que problema maior é fazer crer aos portugueses que os partidos e os políticos não são todos iguais, e que irresponsabilidade, falta de bom senso e impunidade não são uma inevitabilidade da democracia portuguesa. 

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